O STJ aceitou em maio de 2024 a denúncia da PGR (Procuradoria Geral da República) contra Cameli, que inclui também acusações de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro. Eis a íntegra da decisão de recebimento da denúncia no STJ (PDF – 107 kB).
A ação penal contra o governador resulta da Operação Ptolomeu, conduzida pela Polícia Federal em 2019.
O caso tem como base um contrato de R$ 24,3 milhões firmado em 2019 entre o governo do Acre e a empresa Murano, com sede em Brasília, para serviços de manutenção predial. A CGU (Controladoria Geral da União) identificou sobrepreço superior a R$ 8 milhões e superfaturamento de R$ 2,9 milhões neste contrato.
À época, a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, negou o pedido apresentado para afastar o governador do cargo. Os outros 12 ministros votaram de acordo com ela. 1 ministro estava ausente. Cameli é réu desde então, e cumpre com as seguintes medidas cautelares:
- vedação ao contato com testemunhas e demais investigados;
- proibição de deixar o país;
- entrega do passaporte;
- bloqueio de bens e valores.
RELEMBRE O CASO
As investigações apontam que o esquema beneficiou financeiramente o governador e seus familiares. Gledson Cameli, irmão do governador, é sócio da empresa Rio Negro, subcontratada pela Murano para executar os serviços contratados pelo governo acreano.
Segundo a denúncia apresentada pela PGR, o chefe do Executivo do Acre seria o líder de uma suposta organização criminosa. Cameli será julgado pelos crimes:
- organização criminosa;
- corrupção nas modalidades ativa e passiva;
- peculato;
- lavagem de dinheiro; e
- fraude a licitação.
Somadas, as penas podem ultrapassar 40 anos de prisão.
ESQUEMA
A denúncia da PGR contra os acusados tem 200 páginas com material que mostra provas dos delitos, bem como o ponto de partida da suposta fraude licitatória.
Eis como se deu:
- o esquema contou com adesão da Seinfra (Secretaria de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano do Estado do Acre) a uma ata de registro de preços vencida pela empresa Murano, que tem sede em Brasília, e nunca tinha prestado serviços no Acre e não tinha estrutura física no Estado;
- o objeto da licitação foi feito pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano, do campo de Ceres, para a prestação de “serviços comuns de engenharia referentes à manutenção predial”;
- no Acre, a Murano ficou responsável por executar grandes obras rodoviárias por meio de companhias subcontratadas, uma delas a Rio Negro Construções, que tem como sócio Gledson Cameli.
Segundo a denúncia, a adesão à ata de registro de preços foi feita pelo secretário de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano, Thiago Rodrigues Gonçalves Caetano, em maio de 2019 –ele também foi denunciado.
Uma semana depois, a Seinfra assinou o contrato com a vencedora do certame licitatório feito por pregão eletrônico, a Murano. No dia seguinte, a empresa firmou com a Rio Negro uma Sociedade em Conta de Participação.
Para o subprocurador-geral Carlos Federico Santos, o modelo de sociedade escolhido pela Murano teria sido para que o sócio da empresa, o irmão do governador, permanecesse oculto. A lei não permite que familiares de governantes firmem contratos com o poder público.
A denúncia indica que 64,4% do total pago pelo Estado do Acre à Murano decorreu da suposta execução de obras viárias, as quais eram previstas no contrato.
“Aproximadamente 2/3 do valor pago correspondem a objeto totalmente estranho ao contratado, em claro desvirtuamento do princípio da isonomia”, diz um trecho do documento da PGR.
OUTRO LADO
O Poder360 procurou o governador para perguntar se gostaria de se manifestar a respeito da data do julgamento. Não houve resposta até a publicação desta reportagem. O texto será atualizado caso uma manifestação seja enviada a este jornal digital.
Entretanto, quando prestou depoimento em 5 de novembro de 2024, Cameli negou as acusações. Disse que seu irmão não teve qualquer envolvimento em sua atuação no Executivo estadual e afirmou, para esclarecimento, que recebe mensalmente uma ajuda financeira de seu pai.
Além disso, à época do julgamento sobre o recebimento da denúncia, a defesa de Cameli havia afirmado que ele é alvo de perseguição por parte da Polícia Federal. Os advogados alegaram que a investigação foi “enviesada” pela corporação desde o seu início e que há uma tentativa de criar um “excesso de acusação” que ocasiona em um “terrorismo” contra o governador.
Em nota, o governador acreano disse que foi “a 1ª vez” em que ele foi “oficialmente ouvido”.
“A Justiça cumpriu o seu papel, e agora terei a oportunidade de me defender e provar minha inocência e idoneidade”, afirmou.
