JUSTIÇA DERRUBA CENSURA CONTRA REPORTAGEM DE AMAZÔNIA REAL

A Repórter Brasil obteve uma vitória na Justiça e conseguiu a extinção da ação que censurou por mais de 20 dias trechos da reportagem ""Compro tudo": ouro Yanomami é vendido livremente na rua do Ouro, em Boa Vista". A censura havia sido concedida por uma liminar que atendia ao pedido de uma funcionária da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).

JUSTIÇA DERRUBA CENSURA CONTRA REPORTAGEM DE AMAZÔNIA REAL

A Repórter Brasil obteve uma vitória na Justiça e conseguiu a extinção da ação que censurou por mais de 20 dias trechos da reportagem ""Compro tudo": ouro Yanomami é vendido livremente na rua do Ouro, em Boa Vista". A censura havia sido concedida por uma liminar que atendia ao pedido de uma funcionária da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).

Os trechos até então censurados revelam que, em abril de 2021, a servidora entrou em uma loja na chamada Rua do Ouro, em Boa Vista, perguntando se o local comprava "ouro do garimpo". Antes de a reportagem ir ao ar, ela foi procurada por telefone e pelas redes sociais, mas preferiu não comentar. Depois da publicação, ela entrou com um processo judicial contra a Repórter Brasil.

A reportagem, que faz parte da série Ouro do Sangue Yanomami, realizada pela Amazônia Real e a Repórter Brasil, denuncia a aquisição ilegal de ouro extraído da Terra Indígena Yanomami por dezenas de pequenas "joalherias" na Rua do Ouro.

"Como todos os direitos e garantias fundamentais previstos pela Constituição Federal, a liberdade de expressão jornalística tem aplicabilidade imediata, é protegida como cláusula pétrea e deve ser sempre interpretada em sua acepção mais ampla – não por acaso, trata-se de uma das garantias que aparece mais vezes ao longo do texto constitucional", argumentaram a advogada Eloísa Machado de Almeida e o advogado André Ferreira, do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (Cadhu), que defendeu a Repórter Brasil. "A retirada da matéria do ar configuraria odiável censura à liberdade de imprensa, repudiada pela Constituição Federal e diplomas normativos internacionais".

Após contestação dos advogados, o juiz Air Marin Junior, do 2º Juizado Cível de Boa Vista (Roraima), revogou a censura, ao entender que a causa não era da competência do Juizado Especial Cível – que analisa ações menos complexas cujas causas não superem o valor de 40 salários mínimos.

Denúncia contra servidores

O Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye"Kuana (Condisi-YY) enviou um ofício, após a publicação da reportagem, para a Sesai e para o Ministério Público Federal denunciando que 106 vacinas contra a Covid-19 que deveriam imunizar os indígenas foram desviadas para garimpeiros pelos profissionais de saúde.

O ofício do Condisi-YY cita o nome da servidora e de outros quatro profissionais da Sesai, que foram vistos vacinando garimpeiros na região do Parafuri e Parima. E afirma ainda que os Yanomami constataram que esses agentes "retornaram para cidade [Boa Vista] no dia 13/05 em um voo pago pelos garimpeiros".

"Na Comunidade Komamassipi, Região do Parafuri, nem todos os indígenas foram vacinados, e que as vacinas foram utilizadas nos garimpeiros, um total de 45 pessoas, e que foi pago para equipe de profissionais em torno de 15g (de ouro) por vacina", afirmou, no ofício, o presidente do Condisi YY, Júnior Hekurari Yanomami.

É o segundo caso de denúncia de troca de vacinas por ouro. A primeira foi enviada ao Ministério Público Federal pela Hutukara Associação Yanomami nas regiões de Humuxi e Uxiu, em abril. A Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas também denunciou o caso para a CPI da Covid, em Brasília.

Repúdio

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e outras entidades como a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), a Associação de Jornalismo Digital (Ajor), Oxfam, Artigo 19 e Observatório do Clima repudiaram a censura contra a Repórter Brasil.

"O que chama atenção é que o juiz nem sequer ouviu os sites citados na ação. A decisão, embora prevista no ordenamento jurídico brasileiro, causa estranheza porque a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão deveriam receber preferência em relação à proteção da honra, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal" afirmou Abraji ao ser informada sobre a censura.